Thursday, August 27, 2009

Frenético...













As últimas semanas - quase que poderia dizer meses - têm-se sucedido a um ritmo frenético. Já passou mais de um mês desde que regressei de Toronto, e não obstante a vontade de tornar a um espaço que cumpre, amiúde, uma função quase catártica, a verdade é que sinto que o tempo que habito se está a tornar infinitamente mais curto, como que se submetido a um processo que mimetiza, de forma exponencial, o normal movimento planetário rumo a um novo solstício invernal.


Na maior cidade canadiana reencontrei velhos conhecidos de caminhos que trilho há já alguns anos. Os motivos que lá me conduziram não são de agora. Apenas o destino varia.
Na viagem encetada no início de Julho iniciei a leitura de um livro que me tem trazido apaixonado: “ The woman who decided to die - Challenges and choices at the edges of Medicine ” é um livro fabuloso do qual tive conhecimento através de uma critica publicada no New England Journal of Medicine .
Aborda, com um sentido profundamente humano e desprovido de preconceitos, algumas das questões mais prementes daquilo que em tempos aqui designei como “medicina do crespúsculo” e que o autor, Ronald Munson, um bioeticista, designa a páginas tantas como “ indefinite, ambiguous territory between life and death ” .


Releio uma passagem: “ the new Technologies for keeping patients alive – the IV lines, feeding-tubes, and mechanical ventilators – could also trap them in the shadowy realm between life and death ” . Estranho ser confrontado com tamanha evidência a caminho de uma reunião científica de oncologia. Mais estranho ainda quando, uma das pessoas com quem tive o grato prazer de travar conhecimento e mais tarde jantar na CN Tower de Toronto, um jovem colega e investigador brasileiro da Universidade de S. Paulo, veio a falecer há cerca de uma semana, com complicações respiratórias decorrentes de uma infecção com o vírus H1N1, após 2 semanas de coma induzido.


Desde então busco avidamente um pouco de tempo para reflectir sobre reencontros, uniões, momentos simples entre amigos, livros que li, leio, músicas que alegram o dealbar de novos dias ou que reflectem a síntese de outros.


Minhas mãos são instrumentos impotentes na tentativa vã de abrandar ao ritmo alucinante da passagem destes dias de Estio.


O regresso, ainda que breve, à minha querida Amesterdão, cidade que considero cada  vez  mais uma espécie  de segunda  casa providencia um  breve  interregno que me permite olhar a periferia dos dias me trazem envolvidos. Jantar breve, mas não apressado, no centro da cidade, olhando um dos canais e as mulheres e homens que passam, sozinhas - porventura sem estarem sós - ou acompanhadas – porventura na sua já crónica solidão. Uns e outros desfrutando de uma noite não excessivamente quente, onde sopra um vento leve que parece acariciar a cútis, talvez vaticinando a intimidade de outros ventos.


Quanto a mim retorno ao Hotel.
Quando regressei de Shanghai disse que trazia Pudong nas veias.
Hoje parece que trago Pudong na alma.
E os dias escorrem-me por entre os dedos.
Mas, assim como assim, a verdade é que não me lamento com o facto. Apenas constato… e vivo!


[Rui Amaral Mendes]



Rui Amaral Mendes, aqui e no Frágil


1 comment:

mj said...

Um texto forte que suscita pensamentos sobre o início e o fim, o cá e o lá da vida.
Aqueles sentimentos dos que estão ainda bem vivos.
Em lugares, em sonhos, em desejos, em Toronto, no Porto, Amsterdão.
Haverá pensamentos desses nos que estão em coma, real ou imaginário?
A vigília da vida é tão complexa.
Pouco sabemos dela.
Bom regresso Ram