Monday, January 26, 2009

Postais da Crise - Desleixo



















[All photographs © by M. João: all rights reserved]
 

Fotografei à socapa estas figuras de altar que encontrei num antiquário oriental. Se lhe acontecesse ter remorsos, o actual dono deveria devolvê-las. Mas, a quem? Ao Mao? Aos comissários da revolução cultural?


Se fosse por cá, não haveria uma autoridade a quem as entregar. Nem a frades, nem a curadores de museus. É tal o abandono a que votaram alguns palácios e mosteiros deste país, que ninguém daria por um pequeno furto num salão ou numa capela. Se afirmam e insistem que só deram com os grandes rombos nas instituições bancárias quando a crise já ia avançada, jamais descobririam uns roubozitos praticados nesses monumentos perdidos na memória.


Há meses, deparei-me com o Mosteiro do Lorvão. E com o que foi o maior, mais belo e mais rico cadeiral português. Nele vêem-se grandes áreas onde a madeira de jacarandá está piedosamente encoberta por panos cinzentos, porque foi danificada pela chuva. O cadeiral faz parte do coro-baixo da igreja onde, igualmente mal escondidos e encostados a um canto, espreitam os tubos do grandioso órgão desmantelado.


Sinto todo este desleixo como um símbolo da política cultural do país – a de um silêncio indigno, aliado a um tosco encobrimento. Ou tratar-se-á de um novo tipo de revolução cultural? Que fomenta e protege um velado desprezo pela preservação dos nossos bens? Os humanos, os patrimoniais e os ambientais?


Que dó isto me dá.


Maria João

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